quinta-feira, 2 de junho de 2011

Making of de “Os vitrais da sala à prova de som”


Zero
“Os vitrais da sala à prova de som” começou a ser posto no papel, com uma máquina portátil que eu tinha levado de Brasil para Londres em abril de 1984, aos 29 anos. Depois de 135 capítulos, que começa com o Zero, consegui arrancar o livro do meu sistema em agosto de 2010, em São Paulo, aos 55 anos.
Minha intenção quando comecei a escrever o livro era buscar um tema perene e que ajudasse o leitor a dar vida aos personagens que eu achava (e continuei a achar depois que aprendi a conviver com seus fantasmas) que poderia criar.
Depois de uma pesquisa árdua, pois na época, ainda não tínhamos as facilidades da internet, descobri que a tortura de governos contra opositores, uma norma no Brasil dos militares, era um sistema universalizado no resto do mundo.
As conseqüências para os prisioneiros, independente do continente e do regime político que torturava, eram também semelhantes. Arranca-se o preso do seu cotidiano, de suas vestes, de sua alma. O preso perde a noção das horas, do tempo e até das próprias convicções.
Por isso, decidi abrir o capítulo Zero com três personagens principais, Anunciato, Fabiana e Wilson, se conhecendo numa sala imensa, acortinada, apesar de não ter janelas. É a primeira cena de um teatro, como aliás é a sensação que se tem quando se é arrancado da própria vida para os porões de qualquer ditadura.
É impossível acreditar que aqueles homens, aparentemente tão humanos quanto a gente, estejam ali dispostos a espancar, ferir, gritar para arrancar confissões de um assunto que no geral eles já estão cansados de saber.
O preso ou a presa é de um grupo de oposição ao regime, está comprometido com a mudança e talvez tenha a mesma têmpera do torturador, apesar de estar ali por ter, temporatiamente, perdido a batalha.
O capítulo Zero, portanto, é usado para apresentar ao leitor o teatro puro e simples, com todas as nuances de reafirmação dos personagens, com diálogos que começam a insinuar que estamos diante de personagens que incorporam muito mais do que a vida como ela é em nosso dia-a-dia.
E já se percebe nos estridentes diálogos (bem teatrais) que já sofrem ou são vitimas de alguma distorção nas suas vinculações com as realidades imediatas. Mas ainda são de carne e osso, pelo menos é essa a intenção e é assim que muitos leitores e leitoras lhes soprarão vidas.
Continua... Não perca, o Making Of do Capítulo 1. 

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